sábado, 14 de dezembro de 2013

Republicando um textículo natalino

O rompimento com a família fora tão brutal que eu rompi com tudo o que havia vivido. O natal não significava nada. Ainda mais depois que soube ser uma data criada mais de oitocentos anos depois, pela igreja católica apostólica romana, para submeter as religiões nórdicas que nesse dia comemoravam o dia do solstício, da fertilidade da terra, de homenagem às deusas e deuses da natureza. E que só sobreviveu como data porque interessava aos empresários da época uma festa de consumo, onde se gastaria pra eles lucrarem. Aí dá-lhe publicidade, massacre midiático, tudo gira em torno do natal, como do carnaval, do dia das mães, dos pais, dos namorados,...

Mas não adianta, nessa época as pessoas vibram diferente, o astral muda, dá pra sentir. As pessoas ficam mais solidárias, as famílias se reúnem, há todo um clima. Melancolia nas periferias, alguns conseguem amenizar com  uma confraternização em família, grupos se reúnem, os mais diversos, em todas as partes. O pouco se torna muito, há reuniões de excluídos e são lindas, por se basearem inteiramente no afeto. Ali o ser humano mais barbarizado mostra seu lado afetivo, amoroso. Muitas vezes vi acontecer.

Nessa época me parecem muito gritantes as diferenças sociais. Se houvesse uma visão humanística, uma visão de família humana, seria constrangedor dispor de excessos enquanto há tanta gente sem o necessário pra sobreviver. Não é possível entender o porquê da miséria, da pobreza, do abandono, da ignorância. Com todo o desenvolvimento acadêmico, toda a capacidade tecnológica, não se pode acabar com a ignorância, com a desassistência médica e tantas abjeções da sociedade? Duvido. Capacidade tem. O controle empresarial é que não deixa.

A imagem imposta de papai noel é a inteira hipocrisia da sociedade. Quem não come direitinho, as três refeições do dia, fora lanchinho, não ganha presente. A maioria das crianças não ganha.

Eduardo.


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A Santa Claus


Por Luis Sepúlveda


Estimado Santa Claus, Papai Noel, Bom Velhinho,
ou como queira chamar-se ou ser chamado.

Confesso que sempre lhe tive simpatia porque, em geral, me agrada a Escandinávia, sua roupa vermelha me dá um sentimento premonitório e porque, por trás dessas barbas sempre acreditei reconhecer um filósofo alemão que, a cada dia, tem mais razão no que afirmou, em vários livros muito citados, mas pouco lidos.

Não tema pelo teor desta carta, não sou o menino chileno que, há muitos anos lhe escreveu: “Velho safado, no ano passado te escrevi contando que, apesar de ir descalço e em jejum à escola, consegui tirar as melhores notas e que o único presente querido era uma bicicleta, sem querer que seja nova. Não teria que ser uma mountain bike, nem para correr o Tour de France. Queria uma bicicleta simples, sem marchas, para ajudar minha mãe a levar as roupas que ela busca, lava, passa e entrega. Isso era tudo, uma humilde bicicleta. Mas chegou o natal e eu ganhei uma estúpida corneta de plástico, brinquedo que guardei e te envio com esta carta, para que enfies no cu. Desejo que pegues AIDS, velho filho da puta”.

Foram seus elfos, os responsáveis por tão monstruoso desrespeito?

Pois bem, estimado Santa Claus, seguramente este ano receberá muitos pedidos de bicicletas, pois o único porvir que espera os meninos do mundo é como entregadores, mensageiros e trabalhos sem contrato de trabalho, condenados a distribuir pacotes e quinquilharias até os 67 anos de idade. No entanto, não lhe peço uma bicicleta. Peço, em troca, um esforço pedagógico, que ponha seus elfos, anões, duendes e renas para escrever milhões de cartas explicando o que são e onde estão os mercados.

Como você bem sabe, eles nos têm fodido a vida, rebaixado os salários, arrasado as pensões, retirado benefícios das aposentadorias e condenado as pessoas a trabalhar permanentemente, para tranqüilizar os mercados.

Os mercados têm nomes e rostos de pessoas. São um grupo integrado por menos de um por cento da humanidade, donos de 99% das riquezas. Os mercados são os integrantes dos conselhos de acionistas, como são acionistas, por exemplo, de um laboratório que se nega a renunciar aos royalties de uma série de medicamentos que, se fossem genéricos, salvariam milhões de vidas. Não o fazem porque essas vidas não são rentáveis. Mas a morte sim, é, e muito.

Os mercados são os acionistas das indústrias que engarrafam suco de laranja e que esperaram até que a União Européia anunciasse leis restritivas para os trabalhadores não comunitários, que serão obrigados a trabalhar na Espanha ou outro país da U.E., sob as regras de trabalho e condições salariais de seus países de origem. Logo que isto aconteceu, nas bolsas européias dispararam os preços da próxima colheita de laranja. Para os mercados, para todos e cada um destes acionistas, a justiça social não é rentável, mas a escravidão sim, e muito.

Os mercados são os acionistas de um banco que suspende o salário mínimo de uma mulher que tem o filho inválido. Para todos e cada um dos acionistas, gerentes e diretores dos departamentos, as razões humanitárias não são rentáveis. Mas os despojos, as expulsões da pobreza para a miséria sim, é. E muito. E para os ladrões de esperança, sejam de direita ou de direita – pois não há outra opção para os defensores do sistema responsável pela crise causada pelos mesmos mercados –, despojar da sua casa aquela senhora idosa foi um sinal para tranqüilizar os mercados.

Na Inglaterra, a alta criminosa das tarifas universitárias se fez para tranqüilizar os mercados. O descontentamento social levará a ações inevitáveis pela sobrevivência e os mercados pedirão sangue, mortes, para tranqüilizar seu apetite insaciável.

Que seus duendes e elfos expliquem, detalhadamente, que no meio desta crise econômica gerada pela voracidade especulativa dos mercados – e pela renúncia do Estado a controlar os vai-véns financeiros –, nenhum banco deixou de ganhar, nenhuma sociedade multinacional deixou de lucrar e até os economistas mais ortodoxos das teorias de mercado concordam em que o principal sintoma da crise é que os bancos e as empresas multinacionais lucram menos mas, em nenhum caso deixam de lucrar. Que os elfos e duendes expliquem até ficar claro que foi o mercado quem se opôs a (e conseguiu eliminar, financiando campanhas de legisladores a seu serviço - n do T) qualquer controle estatal às especulações, mas agora impõem que o Estado castigue os cidadãos com a diminuição dos seus rendimentos.

E, por último, permita-me pedir-lhe algo mais: milhares, milhões de bandeiras de combate, barricadas fortes, paralelepípedos maciços, máscaras anti-gases, e que a estrela de Belém se transforme numa série de cometas incandescentes com alvos fixos: as Bolsas, que queimem até os alicerces, pois as chamas dos formosos incêndios nos dariam, ainda que temporariamente, uma inesquecível Noite de Paz.

Muito fraternalmente


Fuente: Le Monde Diplomatique                                                                     Tradução - Eduardo Marinho

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O poder real, por trás dos poderes públicos. Ou por cima.

O livro, "Confissões de um assassino econômico", discorre em detalhes todos os dramas internos, além dos procedimentos do poder financeiro sobre os países, que passaram em seu sentimento. A culpa e o conflito interno sempre existiram enquanto ele cumpria seu papel corporativo, dentro do esquema. O livro foi escrito nessa base. E é precioso, pelas informações que espantam alguns, mas não surpreendem, por explicar porquê a sociedade é tão injusta, porquê se tem tanta miséria, ignorância, abandono e sofrimento. E porquê a "política" é tão corrupta, a partir dos corruptores.

Estamos com a “terrível presença do norte” em nossas almas. Esse vídeo faz o resumo de um livro que li alguns anos atrás, “Confissões de um assassino econômico”, de John Perkins (esse mesmo do vídeo), que explica de forma simples e clara de como funcionam as coisas mundiais. John foi um executivo das multinacionais. Um economista que fazia planos de infraestruturas nacionais, sendo construídas pro desenvolvimento dos países, na verdade uma forma torpe de atrelar financeiramente os países aos poderes econômicos. Quem construía eram empresas dos Estados Unidos, o dinheiro nem chegava nos países, eram passados diretamente às construtoras que se escondiam sob o governo, comandando-o.

Não questionamos se o que desejamos é o que nós desejamos mesmo, ou o que nos fizeram desejar. Não percebemos toda a rede de convencimento, de criação de idéias, de valores, de visões de mundo. Exercemos valores e comportamentos condicionados, que servem à manutenção dessa estrutura social. Uma rede criada por um punhado de pessoas que perceberam formas de controlar e dominar a sociedade, de criar vontades e opiniões a seu serviço. Há televisões em todas as casas, formando opinião, empurrando uma visão de mundo que só serve aos poucos riquíssimos, donos de bancos e mega-empresas. São esses que plantam os desejos de consumo, o julgamento de valor humano pela forma, pela roupa ou classe social, os que vivem da angústia das populações, explorando, enganando, controlando políticos e mídia, a televisão, o rádio, os jornais... A vida é um inferno pra grande maioria. É preciso questionar a nossa própria visão de mundo, é preciso pesquisar entre as nossas vontades, entre os nossos valores, quais nos foram implantados? Quais são realmente nossos? De quantas mentiras a gente se deixou convencer? Quanta coisa que a gente acredita que é simplesmente mentira? Eu mesmo não tenho a menor pretensão de “vencer na vida”. A mim me basta viver. Não quero ser melhor que ninguém, se possível gostaria de ser melhor do que eu fui, ontem, de estar aprendendo e melhorando como possa.

Somos nós quem sustenta essa porra toda, somos nós quem pode realmente mudar alguma coisa. Individualmente antes, coletivamente por conseqüência. Essa é a razão da educação pública ser uma merda. Os que comandam têm pavor da idéia de um povo instruído, informado e com um nível de consciência alto, capaz de debater, resolver e decidir os rumos da sociedade. Por isso as escolas públicas não são de qualidade, ai do político que se atrever a investir dinheiro público em educação, ai do que servir à maioria. Há uma televisão na casa de cada um, cada família, mentindo barbaridade, distorcendo a realidade, superficializando o pensamento, induzindo ao consumo como valor social, entre tantos crimes morais, senão legais. Somos (nós, a maioria) mantidos ignorantes e desinformados por decisão dos que dominam, dos que ostentam luxos e desperdícios, convencidos da sua superioridade humana. É preciso perceber o nosso próprio valor. É preciso não se deixar convencer pelos absurdos que a mídia propaga – é preciso ver a mídia como inimiga pública, enquanto for empresarial. Não pra desprezar ninguém, mas pra não se sentir inferior como nos mandam. Dignidade não é arrogância, é preciso não confundir as coisas. Humildemente, não me sinto inferior a ninguém. E se me aparece um convencido da própria superioridade, eu acho é graça. Nem discordo e, se for preciso, faço uma reverência pra ele ir embora. Tenho mais com o que me ocupar nessa vida. O sentimento de inferioridade que se propaga por aí não me toca. O valor é humano, é sentimento, é pensamento, é integração na coletividade humana, é consciência. O problema é confundir valor com preço.

As escolas ensinam a consumir, a disputar, a competir, a querer ser melhor que os outros, a criar conflitos e viver confrontos, com sentimentos de vitória e derrota, ambos deprimentes, cada um à sua maneira. As instituições estão dominadas através do poder “político”.
Pra ter sentido na vida, é preciso andar na contramão.

“Hoje há mais escravidão no mundo do que nunca existiu antes”.  John Perkins

Hoje os escravos fazem fila pra se escravizar.



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O vídeo deixa uma questão em aberto. Acima dos vampiros da humanidade, dos megadominadores, há um poder maior, exercido por todos. É a nossa concordância geral o que sustenta esse sistema social espúrio, criador de sofrimentos pra grande maioria. É preciso ver por si, pensar por si, escolher por si o que se quer da vida. É preciso conferir até onde os próprios valores não foram implantados por artimanhas da publicidade midiática, os comportamentos, os objetivos de vida... há muita coisa pra se criar, pela frente. No mínimo dar um sentido à existência, além das fumaças da ilusão do consumo.

observar e absorver

Aqui procuramos causar reflexão.